Muito se fala quando algum artista desempenha um trabalho que excede o limite do ótimo. E a maioria das pessoas acaba adjetivando tal desempenho como sendo visceral ou, em outro idioma, tour de force. O verdadeiro significado destes adjetivos vai muito além de apenas ultrapassar o ótimo numa atuação. O visceral não dá as caras somente no Cinema: pode ser visto também em palcos teatrais – e, na verdade, é muito mais complicado compor um tour de force on stage – ou ainda durante uma apresentação musical (claro que quando a canção propõe algo no estilo). Mas então, já que visceral não é apenas sinônimo de boa interpretação, o que leva uma pessoa a este estado?
Sendo bem pragmático, visceral é aquilo que transcende a vida particular do artista. Ou seja, quem quiser atuar sob um tour de force, deve se jogar de cabeça na vida de seu personagem e, de fato, assumir a vida que está descrita no papel. Mesmo que nem sempre seja algo palpável – uma vez que o personagem pode sair de um livro ou de um texto original e, desta forma o artista não tem uma base real de quem deve interpretar; quem se submete ao visceral deve criar uma atmosfera única e exclusiva do seu personagem e, quando estiver em frente às câmeras (ou no palco), deixar de lado sua existência e exteriorizar apenas a personalidade de quem deve interpretar. Ser visceral é ter o dom, mesmo que momentâneo, de conseguir sentir o que seu papel sente; é colocar-se na pele dele e deixar de viver sua vida particular naquele espaço de tempo singular. Na verdade, esta questão de ser momentâneo é bastante relativa, pois conheço pessoas que se submeteram a uma atuação muito forte e tiveram problemas, depois da temporada em que a peça ficou em cartaz, de se libertarem dos personagens. Aqui entra o psicológico da pessoa e sua força mental: saber discernir a sua realidade da realidade que está retratada no roteiro.
Passei por uma experiência há uns anos atrás em que optei por entrar num tour de force, quando eu fazia parte de uma companhia teatral. A peça chamava “Entre Uma e Outra, Carolina” e era extremamente complicada: eu interpretei Pedro, o qual decide, no dia do seu velório, se desculpar com todas as mulheres as quais magoou profundamente. Eram cenas muito difíceis que envolviam sedução, ódio, amor, paixão e, principalmente, drama. A minha dedicação foi tanta que em alguns ensaios eu tive que parar e me restabelecer da cena (em duas delas, principalmente: quando ele se desculpa com sua mãe e quando a Morte vem lhe buscar). Até essa oportunidade não sabia ao certo a sensação de interpretar de forma visceral e hoje sei bem que, ao passo que é muito dolorido, nos trás uma felicidade imensa, pois nos provamos. No Cinema temos vários exemplos de atuações neste estilo e vou citar algumas: Glória Swanson (Crepúsculo dos Deuses), Marlon Brando (O Poderoso Chefão Parte I), Vivien Leigh (Uma Rua Chamada Pecado), Bruno Ganz (A Queda! – As Últimas Horas de Hitler), Meryl Streep (A Esolha de Sofia), Daniel Day-Lewis (Sangue Negro). Mas atuar com força total não nos remete apenas a atuações grandiosas e “exageradas”. Peguemos dois exemplos recentes: Paul Giamatti (Sideways – Entre Umas e Outras) e Julianne Moore (Longe do Paraíso). Ambos são viscerais, mas de forma contida, pois seus personagens eram contidos. Esta forma do “ser visceral” é ainda mais complicada, uma vez que o personagem sofre internamente e o artista deve deixar isso bem claro. A retórica (no que tange a “oratória visual e gestual") é de extrema importância aqui, já que se necessita de olhares e gestos que falem por palavras. Particularmente admiro muito um ator ou atriz que consiga se dar bem quando decide estar sob este estado. Por experiência própria – e isso não tem nada a ver com me gabar por isso – digo que é muito complicado e assustadoramente complexo.
Sendo bem pragmático, visceral é aquilo que transcende a vida particular do artista. Ou seja, quem quiser atuar sob um tour de force, deve se jogar de cabeça na vida de seu personagem e, de fato, assumir a vida que está descrita no papel. Mesmo que nem sempre seja algo palpável – uma vez que o personagem pode sair de um livro ou de um texto original e, desta forma o artista não tem uma base real de quem deve interpretar; quem se submete ao visceral deve criar uma atmosfera única e exclusiva do seu personagem e, quando estiver em frente às câmeras (ou no palco), deixar de lado sua existência e exteriorizar apenas a personalidade de quem deve interpretar. Ser visceral é ter o dom, mesmo que momentâneo, de conseguir sentir o que seu papel sente; é colocar-se na pele dele e deixar de viver sua vida particular naquele espaço de tempo singular. Na verdade, esta questão de ser momentâneo é bastante relativa, pois conheço pessoas que se submeteram a uma atuação muito forte e tiveram problemas, depois da temporada em que a peça ficou em cartaz, de se libertarem dos personagens. Aqui entra o psicológico da pessoa e sua força mental: saber discernir a sua realidade da realidade que está retratada no roteiro.
Passei por uma experiência há uns anos atrás em que optei por entrar num tour de force, quando eu fazia parte de uma companhia teatral. A peça chamava “Entre Uma e Outra, Carolina” e era extremamente complicada: eu interpretei Pedro, o qual decide, no dia do seu velório, se desculpar com todas as mulheres as quais magoou profundamente. Eram cenas muito difíceis que envolviam sedução, ódio, amor, paixão e, principalmente, drama. A minha dedicação foi tanta que em alguns ensaios eu tive que parar e me restabelecer da cena (em duas delas, principalmente: quando ele se desculpa com sua mãe e quando a Morte vem lhe buscar). Até essa oportunidade não sabia ao certo a sensação de interpretar de forma visceral e hoje sei bem que, ao passo que é muito dolorido, nos trás uma felicidade imensa, pois nos provamos. No Cinema temos vários exemplos de atuações neste estilo e vou citar algumas: Glória Swanson (Crepúsculo dos Deuses), Marlon Brando (O Poderoso Chefão Parte I), Vivien Leigh (Uma Rua Chamada Pecado), Bruno Ganz (A Queda! – As Últimas Horas de Hitler), Meryl Streep (A Esolha de Sofia), Daniel Day-Lewis (Sangue Negro). Mas atuar com força total não nos remete apenas a atuações grandiosas e “exageradas”. Peguemos dois exemplos recentes: Paul Giamatti (Sideways – Entre Umas e Outras) e Julianne Moore (Longe do Paraíso). Ambos são viscerais, mas de forma contida, pois seus personagens eram contidos. Esta forma do “ser visceral” é ainda mais complicada, uma vez que o personagem sofre internamente e o artista deve deixar isso bem claro. A retórica (no que tange a “oratória visual e gestual") é de extrema importância aqui, já que se necessita de olhares e gestos que falem por palavras. Particularmente admiro muito um ator ou atriz que consiga se dar bem quando decide estar sob este estado. Por experiência própria – e isso não tem nada a ver com me gabar por isso – digo que é muito complicado e assustadoramente complexo.
14 comentários:
Muitíssimo interessante seu texto Kau. É um tema delicado mas que sempre agrada a quem vê o trabalho final, é fantástico, toca. Acho que você esqueceu de citar Heath Ledger que, pra mim, interpretou de forma visceral o Coringa, fato que nem ele conseguiu se desprender e deu no que deu. Não sabia dos seus dons artísticos, não tenho jeito pra isso, acho que nem um cirquinho de esquina iria querer minhas interpretações!! hehehe
Abraço!
Não faço bom uso desta palavra, é verdade. Para mim, qualquer coisa fora do comum já é visceral, quando na verdade, são pouquíssimos exemplos que podemos alcunhar como "viscerias". Destes que você citou, concordo com todos, à exceção de Bruno Gans (que não vi) e Paul Giamatti (que prefiro mais em "Anti Herói Americano" que em "Sideways").
Outra grande atuação, tour de force, visceral, mas SUPER contida foi Helen Mirren em "A Rainha".
O texto está ótimo, e nós temos que tomar cuidado ao falar viscral em "vão". É um adjetivo pesadíssimo, e de fato, poucos podem recebê-lo com louvor.
Abraço!!!!
Excepcional, assim como o Weiner, não faço nem de longe o bom uso da palavra, estou sempre exagerando, o seu texto foi muito bom, já pra enxergamos o quanto exageramos boa parte das vezes, e tentar nos conter !
Abraço!
Gostei bastante do seu texto. E fiquei curioso sobre a sua peça. Qual delas a Carolina?
Sobre Watchmen...seria injustiça dar uma nota maior. Sério!
Algumas cenas beiram o patético e outras chegam perto da genialidade, ficar nessa sanfona de erros e acertos me cansou um pouco durante as 3 horas de exibição...abração!
Kau, não sei se eu consideraria a atuação da Meryl Streep, em "A Escolha de Sofia", como uma tour de force... Acho que ela, na realidade, é uma performance feita de vulnerabilidade, de fragilidade... O filme todo vemos uma mulher serena, mas que passou por uma situação terrível.. É um trabalho memorável da Streep. Talvez, o melhor da carreira dela.
E adorei no texto quando você dividiu sua experiência no teatro conosco. :-)
Beijos!!
massa! vc é ator de teatro!
:P
apesar de Meryl Streep estar mais esforçada em "A Escolha de Sofia" (oscar merecido), gosto mais dela em "Kramer vs Kramer"
abraço, Kau.
:P
Você anda fazendo umas boas reflexões por aqui, hein? Eu sempre estive muito perto de atores - minha mulher é atriz e produtora de teatro, apesar de estar afastada dos palcos - e sempre pude acompanhar de perto processos criativos. É realmente uma jornada.
Eu lembro que uma época, havia um exercício para concentrar as emoções em um objeto. O jogo cênico era dado com um "ator abstrato", inanimado. Nessa mesma época eu vi Com amor, Liza, no qual Philip Seymour Hofman dá literalmente um show de interpretação - ouso dizer que é o seu melhor trabalho - jogando com uma carta suicida deixada por sua esposa.
Lembro que reuni o pessoal do teatro aqui em casa para ver esse filme, e foi realmente reconfortante perceber que o ofício do verdadeiro ator passa longe dos microfones da Rede TV!
Abs!
Kau, na boa, se você ainda não viu Com amor, Liza, pegue amanhã! rs...
Belíssimo post, Kau! É por aí. Entendo perfeitamente o que quis dizer. Aliás, teu blog está cada vez melhor.
Abs!
Robson, obrigado. Concorodo com você sobre Heath e, inlusive, acho que o tour de force dele está no Joker e não no Ennis. Abs!
Weiner, não citei Helen mas ela estava no meu pensamento quando escrevi o texto. Realmente é um tour de force! Ela é perfeita em A Rainha. Paul Giamatti, pra mim, é um dos melhores atores da atualidade. E a sua interpretação em Entre Umas e Outras é impressionante, assim como em Anti-Herói Americano. Abs!
Cleber, obrigado. Fico feliz que meu texto serviu para alguma coisa rsrsrsrs. Abs!
Pedro, a Carolina foi a mulher da vida de Pedro (por coincidência era mesmo o nome do personagem). Dentre várias mulheres que ele teve, ela foi o seu grande amor. Sobre Watchmen, eu estou DOIDO pra ver. Mas está muito corrido... Abs!
Kami, eu concordo com vc sobre como é a atuação de Meryl em Sophie's Choice. Entretanto, ela se encaixa num visceral diferente sobre o qual falei no texto. É algo contido, mas que torna-se complexo, difícil. E foi um prazer falar da peça aqui! Vou tentar achar algum vídeo dela =) Beijos!!
Jeniss, eu era ator. Na verdade, a última peça que fiz foi ano passado, mas já como passatempo mesmo. Acho Meryl extraordinária em A Escolha de Sofia; mas admito que sua atuação em Krames vs Kramer tb é linda. Abs!
Dudu, ando meio inspirado ultimamente, rsrsrsrs. Ainda não vi Com Amor, Liza mas fiquei curiosíssimo! Vou correndo procurar e obrigado pela dica. Eu fiz várias vezes o exercício do personagem abstrato. Na própria Entre Uma e Outra, Carolina em dado momento eu tive que conversar com uma foto e me emocionar enquanto fazia isto. Esse exercício é muito legal... Abs!
Otavio, obrigado! E o Bit vai caminhando... precisa aprender MUITO ainda... rs Abs!!
Olá, Kau! Tudo bem?
Belo texto, mesmo! E nele tem os significados de que o cinema pode oferecer a nós. ;) Lindo, lindo. Só tenho o que dizer isso. rsrsrs. ;)
Beijos! ;)
Visceral é o Marlon Brando em O Poderoso Chefão e o Heath Ledger em Batman - O Cavaleiro das Trevas.
Olá Kauê, tudo bem? Nossa, cara, qu texto legal. Confesso que não fazia a menor ideia disso tudo que você disse, pelo menos dessa maneira que você colocou no post. Achei mito bom, e adorei saber que já fez teatro. E também acho Paul Giamatti e Meryl Streep fantásticos. Esles estão bem em todos os filmes que fazem.
Abraçoas...
Mayara, tudo bem e vc?! Obrigado! Fico feliz que tenha gostado. Beijos!!
Pedro, concordo com você que Heath e Marlon são viscerais!
Thiago, tudo bem e vc?! Que bom que vc gostou do texto. Tentei expôr tudo o que aprendi duranto os 5 anos que fiz teatro. Abrigado pelo elogio. Abs!
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